Paulo Guedes cogita futura fusão do BB com banco americano. Isso é possível?





Em entrevista, economista de Bolsonaro aventou operação para dar mais concorrência ao setor. Depois, disse ser ideia “para o futuro”. Mas processo demandaria licitação (Flávia Pierry)

O futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou que o Banco do Brasil (BB) poderia se fundir com um dos maiores bancos dos Estados Unidos, o Bank of America (BofA). O objetivo seria diminuir a concentração bancária e, ao mesmo tempo, aproveitar a experiência da estatal brasileira com o público latino e replicá-la nos Estados Unidos. Essa, porém, seria uma ideia para o “futuro”, segundo o próprio guru do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Mas será que a proposta é possível e pode trazer bons frutos?

Ao site Poder360, Guedes afirmou que poderia propor para o futuro uma fusão ou um acordo operacional entre os dois bancos, o que permitiria que o BofA passasse a operar no Brasil e o BB, no exterior. Mas faltam explicações sobre o processo, que demandaria mudanças profundas na legislação.

Guedes não poderia ter dito que a fusão seria feita com um banco em específico
E há ao menos um erro de comunicação. Guedes não poderia ter dito que a fusão seria feita com este ou aquele banco, como fez ao citar o BofA. O processo de parcerias ou fusões de empresas públicas somente pode ser feito por licitação, com estudos pormenorizados das vantagens e razões, e, depois, abertura para que qualquer concorrente possa participar do processo.

A advogada e economista Elena Landau, sócia do escritório Sérgio Bermudes Advogados e conselheira do Livres, avalia que uma proposta dessa “não pode ser séria” e que demonstra uma certa pressa da equipe de transição.

“Pensei que era um meme. Essa é a maneira de anunciar isso? Que tipo de fusão seria? Quem vai ser o controlador? O Banco do Brasil não pode ser privatizado, por lei. E porque o Bank of America? Por que não outro banco? Não é assim que faz essas coisas. Banco do Brasil é uma empresa pública, teria de fazer licitação. Para o futuro você pode discutir qualquer coisa para o setor bancário brasileiro. Precisa mesmo de mais gente, de fora, competição. Mas porque você sai decidindo o modelo assim de cara e com o Bank of America?”, questionou Elena.

Para fazer fusões e parcerias com o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, é preciso mexer na Lei de Desestatizações. Teria de ser alterada a lei e criado um modelo de redução da participação da União nessas empresas.

Tais processos dependem de estudos de viabilidade, comprovação dos ganhos da operação para a União e para a sociedade e questões sobre ganhos para o mercado. Todo o processo deve ser feito com transparência, publicando os estudos e abrindo para que possíveis interessados disputem.

Entrada de bancos estrangeiros no país demanda estudo
A economista Elena Landau, que é favorável a privatizações e enxugamento do Estado, avalia que existe mesmo a necessidade da entrada de mais bancos no país, mas que o procedimento tem que ser mais cuidadoso, com mais estudos.

“Tem de acabar esse preconceito com bancos estrangeiros. A ideia está na direção certa. Mas tem de ter procedimentos, escolha do parceiro. Quem vai ser o controlador? É uma enorme discussão. Por que o Bank of America? Quem decidiu pela sinergia? Qual o modelo que a equipe do governo quer para o setor?”, afirmou.

Por que o Bank of America?
No caso da sugestão de parceria com o BofA, paira a dúvida sobre a razão da opção em fazer uma fusão com o banco em específico e não com uma outra rede de grande porte, que poderia ou não ser sediada nos Estados Unidos.

O Bank of America é a terceira maior empresa do mundo, de acordo com a revista Forbes. O banco tem uma das maiores redes de atendimento nos Estados Unidos, mas há concorrentes de peso nesse setor que poderiam ter interesse em uma parceria com o BB.

“Paulo Guedes está ignorando que a privatização tem que ser por leilão e que ele não pode escolher quem comprará o BB ou com quem o BB fará a fusão”, afirmou um técnico do governo, em condição de confidencialidade.

Concentração bancária é problema, mas não se resolve com fusão
O Banco Central (BC) acompanha a concentração bancária no Brasil, o que geralmente é entendido pelo senso comum como um dos motivos para as altas taxas dos serviços, inclusive as taxas de juros. Porém, a hipótese de fundir o BB com algum banco não garantiria maior competição. Banco do Brasil e o Bank of America, se fundidos, seriam a mesma empresa, portanto não competiriam entre si.

Além disso, o BC refuta essa visão de que com mais bancos os juros são menores. No Relatório de Economia Bancária (junho 2018), o BC afirma que estudos mostram que existe até uma relação inversa em alguns países, ou seja, países com poucos bancos e taxas mais baixas de juros. “Verifica-se também que o aumento da concentração do sistema financeiro ocorrido depois da crise financeira, mesmo em países menos afetados pela crise, não foi acompanhado por aumento dos spreads. Esses dados trazem evidência de que maior concentração bancária por si só não causa spreads elevados”, afirmou o banco no relatório.

Para o BC, o spread (lucro do banco nos financiamentos) é mais influenciado por inadimplência, custos administrativos, impostos e margem financeira.

Atualmente, os cinco maiores bancos que atuam no país detém 82% da participação de mercado (pelo critério dos ativos totais no sistema), segundo o BC. Essa é uma proporção elevada, a maior entre países em desenvolvimento. Mas há países com nível similar, como a Austrália (80%), a França (82%), e a Holanda (89%).

Nos últimos anos, a concentração bancária no Brasil aumentou como as aquisições do HSBC pelo Bradesco e do Citibank pelo Itaú-Unibanco. (Fonte: Gazeta do Povo)

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